Eu e meu primo naquele dia
Outono de 1989!
Essa é a história de uma punhalada pelas costas dentro da própria família.
Estava brincando com meu primo Daniel e ao mesmo tempo saboreando uma bolacha trakinas que eu tinha.
O Daniel me pediu uma bolacha, e eu dei. Depois me pediu outra e eu tambem dei. Depois pediu outra e mais outra e mais outra... até que chegou a última e eu falei que não! Assim, curto e grosso. Vcs podem estar pensando que eu era egoista e tudo mais, mas não sou. Eu não dei por dois motivos:
1. O pai do Daniel era dono de padaria, e ele podia ter todas as bolachas que quissesse. Assim como enroladinhos, chipas, pizzas, salgadinhos, pães de queijo, esquines, toddynhos, iogurtes e tantas outras coisas deliciosas que um filho de padeiro pode ter;
2. Sabe-se lá quando eu teria oportunidade de comer outra trakinas. Em casa não tinha dessas coisas. sempre que eu comia era na casa do patrick, quando eu entrava sorrateiro pela casa, e pegava uma ou nove bolacinhas, escondido. Além do mais, pelo que me lembro, depois desse dia eu fiquei uns 4 meses sem ter o gosto de uma gordura trans na minha vida.
Bom, agora que vcs já sabem pq eu não dividi aquela bolacha, podemos voltar ao texto.
O Daniel, não gostou nada de eu não ter dado a última e preciosa bolacha trakinas para ele. Então ele, como uma cobra faminta, bolou um plano de vingança para mim. Sim, meus leitores, o Daniel é do tipo sabidão... malandrão, desde criança. E o pior, ele sabia que vingança era um prato que se comia frio, e como um bom estrategista, armou o bote e esperou sabiamente o momento de atacar.
Traduzindo, continuamos brincando como se nada tivesse acontecido.
E brincamos de carrinho, pois ele levou os dele. Brincamos de bicicleta, pois ele levou a dele, jogamos bola, pois ele tb levou a dele. Brincamos muito até que chegou a hora de irmos tomar banho.
Eu tive que sair para limpar a bagunça lá fora enquanto Daniel tomava banho. Quando o infeliz saiu, minha irmã e mãe quase que chegaram ao nirvana. Pois o viadinho do meu primo saiu do banheiro e deixou ele mais limpo que quando entrou. O perfeito trabalho de uma doméstica de 30 anos de experiência.
E então, eu que estava voltando para dentro de casa, com as gotas do sereno em meu corpo, misturado com o suor de quem estava trabalhando lá fora e com um cheiro caracteristico, pude observar as duas falando coisas do tipo:
Irma: Isso que e menino!
Mãe: Esse menino vai longe
Irmã: Por que o gabriel não é assim?
Mãe: Esse menino é um primor.
E ficavam passando a mão na cabeça dele, enquanto assavam uns biscoitos para ele comer.
Ele me olhava de lado com a típica cara de um descendente de mexicano com ódio nos sangres.
Eu é claro não estava entendendo nada, e inoscentemente perguntei:
_Por que estão falando assim com ele?
E fui interrompido com um grito gutural de minha mãe dizendo:
_ Vai tomar banho pobre diabo!
E eu fui... se eu fosse um cachorro, tinha colocado o rabo entre as pernas, mas como não sou, levantei a cabeça e fui com dignidade, e corpo suado de quem limpou toda a sugeira lá de fora.
Tomei meu banho sossegado. Esfreguei as partes, as dobras, lavei o cabelo, o subaco, escovei os dentes e deixei o banheiro como qualquer criança que não tenhas planos de vingança deixaria.
Quando eu abri a porta e senti o cheiro dos biscoitos, fiquei feliz. Eu queria era cantar de felicidade... mas novamente fui interrompido pela minha irmã, mãe e Daniel.
Mãe: Mas que merda é essa?
Eu: hã?
Irmã: Que zona é essa no banheiro?
Eu: Hum?
Daniel: tsc tsc primo.
Eu: Maldito... vou te matar...
Mãe: Ninguem vai matar ninguem. A não seu eu se vc não arrumar toda essa folia no banheiro.
Eu: Mas...
Mãe: Nem "mas" nem "menos"... ora seu moleque, vai aprender a respeitar o trabalho alheio...
E toma-le porrada...
enquanto eu apanhava, minha irmã servia os biscotinhos amanteigados para o filho do padeiro, e eu apenas ali rezando para que tudo aquilo acabasse, e constantemente me perguntava:
_oh Lord, why me? I don't diserve a normal life, like other children?
tudo é relativo
Resumindo...
Eu limpei lá na frente, limpei o banheiro, apanhei, fui submetido a efeitos morais, e quando estava mais uma vez cansado, foi que notei que não tinha mais nenhum biscoito na bandeja.
O Primo do coração, comeu tudo na varanda e deixou farelo para tudo que é lado.
E é claro, que ele me olhou e disse:
Desculpe primo, mas se eu fosse vc eu limpava isso, pq sua mãe ta brava.
e é por isso que durante os próximos 6 anos, eu dei uma sumida.
fim